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  • Foto do escritorModaparamim

A moda é sempre um vir a ser

Atualizado: 12 de jul. de 2020




A moda é sempre um vir a ser. E isso é o que mais me fascina. Regida por suas forças contraditórias e ambíguas, cujas "lutas e compromissos fazem o nosso destino". Segundo Simmel, ela nos "desobriga da execução atual da dificuldade de carregar a si próprio". Procura distinção enquanto deseja avidamente por pertencimento, procura o transitório no permanente, a diferença individual primeira.


A moda particulariza o sujeito ou escraviza a mente em uma pseudo sensação de autonomia e liberdade? A resposta não é tão simples quanto parece. Aprendemos no Império do Efêmero que a moda consuma-da vive de paradoxos, "sua inconsciência favorece a consciência, suas loucuras, o espírito da tolerância...". Há de se habitar as fissuras do tempo para compreender a complexidade de seus tentáculos.


A moda está sempre vinculada à fronteira do indivíduo e da sociedade, ela faz com que nós percebamos as coisas e o tempo histórico de nós mesmos.


De tantas funções e definições que tentam abarcar a complexidade do fenômeno da moda, uma me é particularmente cara, a de pensá-la como uma linguagem que opera descobertas em termos de formas, volumes e cores que atuam sobre um corpo, redesenhando sua subjetividade. E mais interessante ainda é pensar que essas descobertas são capazes de amplificar nosso repertório imagético-existencial, nos fazendo adquirir outras experiências de mundo e possibilidades cognitivas.


Em Cartografias do desejo (1999), Félix Guattari e Suely Rolnik nos apontam a subjetividade como sendo uma espécie de figura “da dobra” - produzida em relações saber/poder e também dos sujeitos consigo mesmos, quando estes se colocam como objetos para um trabalho sobre si. A subjetividade se produz na relação das forças que atravessam o sujeito, no movimento, no ponto de encontro. Me divirto pensando na moda como um grande laboratório.


Percorro meu caderno de criação em busca de palavras, há coisas da gente que só sai por escrito, não é? E eu sou dessas que acredita que quanto mais resistência há em escrever, neste ou naquele dia, mais temos que afiar o grafite e enfrentar o hiato. Acho então em meu caderno que a vida é feita de hiatos. Acho também o seguinte dizer: "dissolve no ar o peso de ser uma coisa só". Falo de mim, da vida, e falo também da moda. Suspiro e aceito que essa é a sua maior beleza.


Em termos saturninos e capricornianos, concordo cada vez mais com Lipovetsky quando ele nos aponta que é preciso deixar o tempo fazer sua obra. E mais: "no filme acelerado da história moderna, dentre todos os roteiros, o da Moda é o menos pior". Tem coisa mais linda do que termos a permissão de fabular? Reduzir pois sua inclinação obscurantista deve ser a nossa missão.


Renata Santiago

Fortaleza, 05 de julho de 2020.

20:15


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